Celac: Presidentes latino-americanos criam novo bloco regional e deixam EUA de fora
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Celac: Presidentes latino-americanos criam novo bloco regional e deixam EUA de fora


Presidentes e representantes dos 33 países da América Latina, reunidos na sexta-feira, dia 2, em Caracas, formalizaram a criação da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac).

Claudia Jardim, via BBC Brasil

Será a primeira vez que os países do continente se articulam em uma mesma plataforma política – com a tarefa de tentar aprofundar a integração regional – sem a presença dos Estados Unidos e do Canadá.

Segundo analistas, a Celac nasce com o desafio de criar uma organização capaz de gerar consenso entre os países e cuja institucionalidade seja capaz de implementar políticas de integração autônomas em relação aos Estados Unidos.

Entre as contradições a serem enfrentadas pelo bloco está a de construir políticas comuns em uma região ainda marcada por diferentes níveis de desenvolvimento econômico, pobreza, crime organizado e, em especial, antagonismos no campo político-ideológico.

O presidente venezuelano Hugo Chavez, conhecido pelas críticas ao governo de Washington e pelo discurso anti-imperialista em encontros regionais, adotou um tom moderado ao falar sobre a nova organização regional e reconheceu que ela deverá respeitar a heterogeneidade dos países e de seus projetos, estejam eles à esquerda ou à direita do campo político.

“Temos de ter muita paciência, muita sabedoria. Não podemos deixar-nos levar pelas ideologias governantes em um país ou outro”, disse Chavez na quinta-feira, dia 1º, minutos antes de receber a presidente Dilma Rousseff no Palácio de governo. “Este processo tem de ser independente do socialismo cubano, do socialismo venezuelano ou do sistema de governo e ideologia do governo do Brasil, da Colômbia [...] é a união política, geopolítica, e sobre esta união vamos construir um grande polo de poder do século 21.”

Institucionalidade
O maior desafio para a Celac será “passar da afirmação de uma identidade e articulação política a uma institucionalidade que permita aos países tomar decisões”, disse à BBC Brasil Luís Fernando Ayerbe, coordenador do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da Unesp.

Uma das propostas do documento constitutivo da Celac é um protocolo de defesa da democracia e direitos humanos, aos moldes da cláusula antigolpe de Estado estabelecida pela União de Nações Sul-Americanas (Unasul).

Entre as divergências iniciais está a posição do novo bloco a respeito do futuro da Organização de Estados Americanos (OEA), cujo papel passou a ser questionado durante a crise boliviana, em 2008, e depois do golpe de Estado em Honduras, em 2009.

Venezuela, Equador e Bolívia defendem que a OEA já teria cumprido seu papel histórico no hemisfério e deve ser substituída.

“Não é possível que os conflitos latino-americanos tenham de ser tratados em Washington”, defendeu o presidente equatoriano Rafael Correa, dias antes da Cúpula. “Espero que mais cedo ou mais tarde a Celac possa substituir a OEA, que historicamente tem tido grandes distorções”, acrescentou.

Para o analista internacional Edgardo Lander, professor da Universidade Central da Venezuela, a Celac tende a contribuir para o enfraquecimento da OEA, mas ainda é cedo para falar de sua extinção. “A substituição da OEA pela Celac não será fruto de um decreto ou de declarações a favor ou contra, e sim pelas vias de fato”, disse à BBC Brasil.

Lander cita como exemplo a atuação da Unasul na resolução do conflito da Bolívia, em 2008, que ele considera “decisiva”. “Se a Celac mostrar que pode solucionar os conflitos regionais sem a intervenção dos Estados Unidos, o papel da OEA vai perder força naturalmente.”

Independência
Para o economista norte-americano Mark Weisbrot, co-diretor do Center for Economic and Policy Research, de Washington, a Celac é criada em um momento em que a América Latina se consolida como uma região “mais independente do que nunca”.

“Washington ainda é o principal problema no hemisfério, especialmente com respeito à democracia e à autodeterminação nacional”, disse Weisbrot à BBC Brasil.

O analista político venezuelano Carlos Romero, professor de estudos internacionais da Universidade Central da Venezuela, diz que a criação da Celac é um “passo positivo que marca um processo de maturidade política” da região. No entanto, ele afirma que isso não necessariamente significará a existência um bloco antagônico a Washington. “Os EUA já não exercem a mesma tutela do passado”, diz.

A discussão do grupo ainda deve incluir a criação de um fundo de reserva para enfrentar a crise financeira internacional. “Quanto mais nos integrarmos, mais estaremos preparados para enfrentar este furacão que a economia mundial está vivendo e a instabilidade do resto do planeta”, afirmou o presidente colombiano Juan Manuel Santos, principal aliado dos Estados Unidos na América do Sul.

Liderança brasileira
Os especialistas concordam que o Brasil tende a assumir um papel de “liderança natural” na Celac, protagonismo que antes era dividido com o México, quando se tratava do hemisfério como um todo.

“O Brasil é uma potência regional, tem sido protagonista pró-democracia e em defesa independência regional na América Latina. Deve ajudar a desempenhar este papel dentro Celac”, disse Mark Weisbrot.

O governo brasileiro vê a Celac como o “terceiro anel” do processo de integração regional, seguido do Mercosul e da Unasul.

A reunião de cúpula para a abertura da Celac havia sido marcada para 5 de julho, mas foi adiada imediatamente após o presidente venezuelano Hugo Chavez ser diagnosticado com câncer, no final de junho.

A Celac unificará as estruturas do Grupo do Rio, mecanismo de consulta internacional regional criado em 1986, e da Comunidade América Latina e Caribe (Calc) e deve trabalhar em cinco áreas: política, energia, desenvolvimento social, ambiente e economia.

***

Celac aprova cláusula para punis golpes de estado
Os países-membros da Comunidade de Estados Americanos e Caribenhos (Celac) ratificam na sexta-feira, dia 2, a incorporação de uma cláusula que pune o país em que o governo for derrubado por um golpe de Estado.

No documento, ao qual a BBC Brasil teve acesso, os países preveem a expulsão imediata do país que sofrer qualquer ruptura em sua institucionalidade democrática, até que a normalidade constitucional seja novamente restabelecida.

“A cláusula mostra o compromisso de todos com a democracia”, afirmou o subsecretário para a América Latina Antonio Simões, em entrevista a jornalistas brasileiros.

Aos moldes da carta democrática da Organização de Estados Americanos (OEA), a cláusula é menos robusta que a declaração democrática da Unasul, que prevê sanções econômicas ou bloqueio comercial aos países cujos governos sejam provenientes de golpes de Estado.

Os 33 países do Celac, reunidos em Caracas, na Venezuela, também se comprometem no documento a manter o respeito “irrestrito” ao Estado de Direito, à “soberania” e “integridade territorial”, à defesa da democracia e à “vontade soberana dos povos” e das “liberdades fundamentais”.

O compromisso com a democracia começou a ser reforçado nas organizações multilaterais latino-americanas depois que o fantasma do golpe de Estado passou a rondar a região, após a deposição do presidente de Honduras, Manuel Zelaya, em 2009, e a tentativa frustrada de tomar o poder através da força no Equador em setembro de 2010.

Com a criação da Celac, Cuba – signatária da cláusula democrática – volta à esfera de integração política hemisférica, de onde esteve isolada desde 1961, quando a ilha foi expulsa da OEA após declarar o caráter socialista da Revolução Cubana.

Os Estados Unidos, que pressionaram para promover a expulsão e o isolamento da Ilha, qualificam ao governo cubano como uma ditadura.

Consenso e direito a veto
Até agora, o ponto mais polêmico na elaboração da carta de procedimento da Celac foi sobre como tomar decisões entre os países do bloco.

A maioria dos países, dentre eles Brasil e Venezuela, defende que as decisões sejam tomadas por consenso. Neste caso, um voto contrário pode se converter, na prática, em um direito ao veto de qualquer moção.

O governo brasileiro considera que é preciso deixar que a organização funcione por um período, para logo definir procedimentos mais rígidos.

“O Brasil prefere sempre o consenso. O consenso é a busca do equilíbrio. Tem um sentido agregador”, defendeu o subsecretário Antonio Simões. “É preciso construir um acordo político em que todos estejam representados”, acrescentou.

Simões reconhece que o país que for capaz de construir maioria leva vantagem, mas defende o consenso como “um direito de veto do mais fraco, não do mais forte”.

O Equador, que lidera a contraproposta, defende um tipo de votação em que uma moção possa ser aprovada por maioria qualificada, caso não haja consenso. A chancelaria equatoriana diz que a opção deverá evitar “frear os avanços da organização em consequência da vontade de um membro”.

O receio do Equador é que, com o direito à veto, alguns países da Celac sejam instrumentalizados pelo governo dos Estados Unidos para frear acordos comerciais e políticos que não interessem a Washington.
Caberá aos presidentes a decisão final sobre a polêmica.

OEA
O Brasil, visto por especialistas internacionais como um “líder natural” da nova instituição, tenta minimizar os riscos de rivalidade entre a Celac e a OEA.

“Nossa preocupação não é trabalhar contra nenhum organismo e sim a favor da região”, afirmou Simões.

As críticas à OEA e a sua capacidade de lidar com conflitos da região, como no caso do golpe de Estado em Honduras e da crise boliviana em 2008, centralizam o argumento dos países que acreditam que a organização já cumpriu com seu dever histórico.

“A OEA representa o velho, o caduco”, disse o presidente venezuelano Hugo Chavez, afirmando que a Celac irá substituir gradativamente a OEA.

No campo econômico, os países-membros se comprometem a estudar um plano de redução das tarifas alfandegárias para aumentar o intercâmbio comercial, como medida para enfrentar a crise financeira internacional.

Na “Declaração de Caracas” que deverá ser ratificada pelos presidentes no sábado, dia 3, os países também se comprometem a ter como princípio a solução pacífica das controvérsias e fica proibido “o uso ou ameaça de uso da força”.

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